FRONTISPÍCIO DAS ARTES

A arte começa onde a imitação acaba. Oscar Wilde

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Cultura & Arte em Debate/ É uma Cópia ou uma releitura?




Uma das pinturas mais conhecidas da arte brasileira, presença cativa nos livros escolares, é o Independência ou Morte, do pintor paraibano romântico Pedro Américo de Figueiredo e Melo (1843-1905). O óleo sobre tela de 4,15 x 7,60 metros, pintado pelo antigo aluno da Escola de Belas-Artes de Paris, em 1888, em Florença, na Itália, pertence ao acervo do Museu da Cidade de São Paulo. Lá está como obra número um, espécie de Mona Lisa se considerado seu poder de atrair visitantes para o mesmo espaço. Por medida cautelar contra almas mais exigentes adianta-se que o magneto nacional é bem menos poderoso que a tela maioral do Louvre.

No entanto, poucos sabem que paira sobre o Independência, conhecido também por O Grito do Ipiranga, a dúvida do plágio. Ou se preferem, a eventual inspiração em uma aquarela feita treze anos antes. Trata-se do 1807, Friedland, de Jean-Louis Ernest Meissonier (1815-1891). A cena do pintor autodidata francês mostra Napoleão Bonaparte e seu estado-maior saudando o regimento dos curaceiros antes de encetarem ataque durante a Batalha de Friedland. Os soldados de cavalaria equipados com armadura foram peça capital nas vitórias do imperador de origem corsa rumo ao domínio do Velho Continente. Vale lembrar, derrotado no fim da carreira, Bonaparte deixou a França menor do que a encontrou, embora o grandeur não se meça em palmos de terra.

Meissonier era um meticuloso pintor de quadros de pequeno formato, repletos de detalhes. O 1807, Friedland foi o maior deles, mede 1,36 por 2,42 metros - um dos cinco episódios pictóricos imaginados pelo autor sobre a vida de Bonaparte. As fisionomias dos cavaleiros obedecem uniformidade que deixa a impressão de que o autor fez economia de recursos ou teve o propósito de criar um exército de clones montados. Sempre a mesma expressão, a do homem maduro, bochechas salientes, bigodes, nenhuma nobreza e até um certo traço de vulgaridade.

O quadro ganhou fama em 1876 quando foi comprado do artista pelo americano Alexander T. Stewart (1803- 1876). próspero dono de uma rede de lojas de departamento. Ele pagou 60.000 dólares, na época, a soma era astronômica para uma obra de arte. Detalhe: Stewart adquiriu a pintura sem vê-la, entusiasmou-se só pela descrição. Messionier, soldado durante o sitio de Paris, em 1870, escreveu a Stewart: “Eu não queria pintar uma batalha, mas Napoleão no zênite da glória. Pintei o amor, a adoração pelo grande capitão em quem os soldados tinham fé e por quem estavam dispostos a morrer.”

Depois da morte Alexander T. Stewart, a viúva Cornelia casou-se de novo. O novo marido passou o 1807 nos cobres, vendeu o quadro por 66.000 dólares ao juiz Henry Hilton. Em 1887, homenageando a memória do velho amigo Stewart, o juiz doou a obra ao Museu Metropolitano de Arte, de Nova York, onde está até hoje, na sala dedicada a pintura francesa do século XIX. O presidente do Met, John Taylor Johnston, escreveu comovido agradecimento: “… prova do espírito público dos nossos cidadãos para o Museu fazer valer a metrópole do nosso país.”

O óleo sobre tela Independência ou Morte foi subvencionado pelo Império. Gonzaga Duque sustenta no livro Mocidade Morta, um Pedro Américo protótipo de pintor oficial. Aquele sujeito com aptidões para promover a própria arte, servindo-se de modo desinibido das instituições públicas. Em 1858, Américo escreveu carta a Pedro II: “Agora pois que tenho os conhecimentos que para a Pintura poderia receber da dita Academia, para prosseguir na minha carreira indispensável é uma viagem à Europa, e como a Academia não me pode facultar os meios necessários para esta viagem, por ter ela preenchido o número de seus pensionistas, venho confiado na extrema bondade de Vossa Majestade Imperial solicitar a graça de me mandar particularmente acabar meus estudos na Europa.”

Por Antonio Ribeiro

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